Programa n.º 6 [25/AGO/2010]

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Capítulo 1: A Sala (Parte 1)


Conforme vos prometi, ainda aqui estou neste enorme vazio em forma de sala.

Já muito tentei falar com esta estranha e especial semelhante. Mas, na realidade, ainda nem o seu rosto consegui ver.

Aliás, durante este tempo todo de silêncios, estive a observar este estranho espaço.

Quanto mais tempo passo aqui dentro, ao contrário do que seria expectável, a sala parece-me maior, mais quente, apesar da sua extrema simplicidade e austeridade.

Acho que me vou levantar e observar mais de perto aquela moldura despida que vos falei e já vos contarei mais pormenores.



Capítulo 2: A Sala (Parte 2)


Depois de bem observada aquela moldura, descobri algo que me tinha escapado. Não está despida. Ostenta sim um grande espelho. A mimetização das paredes desta sala assim me induziu a vista em erro.

Mas não é um espelho vulgar, estanhífero, é feito de uma pedra polida, que julgo ser obsidiana, produzido com a mesma perfeição que o resto da sala.

Porque será um espelho o único objecto deste espaço quando, na realidade, a estranha semelhante que o habita não me dá o privilégio de ver as suas faces?

Vou continuar a procurar mais pormenores por esta sala.



Capítulo 3: A Sala (Parte 3)


Após uma grande e pormenorizada busca pela sala, encontrei mais um estranho pormenor.

Uma pequena caixa, feita em ferro enegrecido, junto a canto, semiaberta, da qual se escutavam vários ruídos ritmados, mas não sincronizados, chamou a minha atenção.

Estava cheia de relógios. Mas, na realidade, nenhum deles partilhava hora, nem minuto, nem segundo. Estava cada qual por si.

Que quererá isto dizer? Uma semelhante que vive num local onde um desvio de poucos milímetros seria capaz de desorientar o mais desleixado transeunte, e que vai até ao coração da Cidade Invisível afrontar tristes almas de relógio em punho, não consegue ter os relógios todos certos?

Já são muitas a perguntas para lhe fazer, vou tentar, mais uma vez, falar com ela.



Capítulo 4: A Sala (Parte 4)


Já estou de novo sentado junto desta estranha semelhante. Digo semelhante, mas, cada vez mais, as semelhanças connosco, anónimos e insignificantes transeuntes, são menos.

Continuo sem lhe ver o rosto. Ela não fala comigo. Mas porque será? Não sei mais o que fazer. Resta-me sentar aqui e continuar a esperar. Talvez me esteja a testar, não sei.

Certo é que não vou desistir, vou continuar à espera...


Playlist:

Soft Machine - Facelift [Third, 1970 - CSB]
Tangerine Dream - Madrigal Meridian [Cyclone, 1978 - Griffin]
Pink Floyd - The Narrow Way (Pt. 1-3) [Ummagumma, 1969 - Capitol]
Eloy - Decay of Logos [Ocean, 1977 - EMI]

Programa n.º 5 [18/AGO/2010]

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Capítulo 1: Cruzamentos

Como vos prometi na última viagem, comecei a caminhar por este colossal labirinto, o qual me está a impossibilitar o contacto com aquela semelhante, está-me a cansar ou, talvez, a testar.

Desde a última vez que partilhei o meu pensar convosco, não parei de caminhar, de tentar encontrar o epicentro desde pecado em forma de imponentes arbustos verdes. Mas, por muito mais que o tente, não o dou conseguido. Julgo repetir sítios com maior frequência que o meu semelhante erra.

O cansaço é tanto que o desfalecimento já se ritmou de forma sincopada com a ânsia de continuar. Não há tempo nem espaço para estes caprichos físicos impostos pelo Criador.

Mas porque será esta senda do metafísico carnal tão complicada?

Não posso desistir, vou continuar a procurar o final deste labirinto.


Capítulo 2: Diagonais

Não posso mais. O cansaço é já tanto que me sinto capaz da mais cobarde rendição, que é abrir os olhos e deixar este mundo de falsificas expectativas sonhadoras.

Já estou farto disto! Não tenho porque me sujeitar ao caprichos da terrível e adormecida Providência, que há já muito que jaz no seu próprio reflexo.

Vou começar a desbravar estas clasutrofóbicas muralhas de vida inanimada. Vou directo ao que busco. Sempre em frente. É hora de me libertar das nauseabundas leis do Criador!


Capítulo 3: O reduto final

Mas, que é isto? Que impenetrável fortaleza de metal é esta? Não vejo janelas, não vejo portas. Aliás, não vejo qualquer tipo de vão que comunique com o exterior.

Poderosos e ensurdecedores ruídos provêem do interior. Como que um colossal lamúriro emitido do núcleo do planeta em forma de uma monumental sofridão.

Que se passará lá dentro? Ou melhor, será isto a cobertura de algo ou será isto algo por si mesmo. Nunca na minha parca vida os meus olhos me mostraram algo semelhante.

Oiço torções, como que um esmigalhar de putrefactos ossos humanos. Como que uma queda para um abismo que nem o virar dos milénios conhecerá o seu fim.

Melhor ainda, parece que aqui tudo nasce. Aliás, parece que tudo morre. Não sei. Se calhar é esta a fábrica de todo este tormento ao que o Criador nos condenou.

Sinto uma força mais forte que a vontade em saber o que acontece dentro deste volume metálico.

Ventos ciclónicos estilhaçam sonhos perdidos e vontades idas. Um negro mais horrendo que o próprio coração do Homem ofusca qualquer luz de insignificantes esperanças. A erva deste chão ondula de tal modo que nem a mais tenebrosa noite em alto-mar seria capaz de o intimidar.

Tento tocar neste volume mas não consigo. Um estranha e incerta sensação de frio glaciar e quente do deserto invade o meu corpo.

Mas vou resistir. Sei que lá dentro estará o desígnio desta fuga do coração da Cidade Invisível.

Tenho de resistir. Já cheguei longe de mais.



Capítulo 4: Mundo em transição

Calma, este caos todo que abraçava esta enorme estrutura metálica está a terminar.

Um fresca brisa vai ocupando o seu lugar. Um forte luz faz renascer o sítio. As tormentosas sonoridade são gradualmente substituídas por delicadas melodias.

Ouve-se um piano desafinado no seu interior. Mas tocado com inigualável delicadeza e bom gosto que transforma o errante martelar nas cordas tão perfeito e harmonioso como a mais correcta frequência.

Quem o tocará?

Com toda esta luz, consigo já distinguir por entre o amontoado de ferro uma pequena porta. Vou entrar!

Mas que vejo? Não há nada aqui dentro para além de um longo pavimento em virgem lajes de mármore branco. As paredes, prolongam-se na mais perfeita simetria, criando um vão cúbico onde o mais pequeno traço feito sem régua seria capaz de fazer vomitar o mais assimétrico dos meus semelhantes.

Numa das paredes existe uma moldura num material que não consigo distinguir, mas que julgo ser uma madeira exótica, proveniente do mais longínquo espaço extra-cidade, vazia. Algo falta ali ou, se calhar, a mim é que me falta algo para a conceber assim despida.

Mas o que realmente importa destacar nesta sala está junto a um canto, implantado de forma despropositada.

Um piano de longa cauda, negro como o espectáculo que há pouco vos descrevi lá fora, tocado de forma ininterrupta por uma semelhante, sentada com a maior austeridade, com os seus longos cabelos negros, concentrada no seu tocar e completamente indiferente à minha presença.

Mas, mais uma vez, não lhe consigo ver o rosto. Não interessa. Consigo reconhece-la. É a portadora do relógio que vi semimorta junto àquele rio numa das minhas anteriores viagens.

Quem será? Porque vive neste sítio? Mais, que sítio é este?

Por hoje estou exausto de emoções. Vou-me sentar aqui, a escutar as suas perpétuas melodias, sonhos voláteis.

Sinto um conforto quase ventral. Quase que regresso ao estado embrionário. Juro-vos, por estes olhos bem fechados, que prolongaria este momento até à eternidade.

Vou ficar aqui sentado...

Playlist:

Four Tet - Love Cry [There is Love in You, 2010 - Domino]
Einstürzende Neubauten - Fiat Lux- A) Fiat Lux B) Maifestspiele C) Hirnlego [Haus der Lüege, 1989 - Potomak]
Einstürzende Neubauten - Das Schaben (excerto) [Halber Mensch, 1985 - Potomak]
LaMote Young - Well Tunned Piano, Pt. 1 (excerto) [Well Tunned Piano 81 X 25, 1988 - Gramavision Records]

Programa n.º 4 [11/AGO/2010]

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Capítulo 1: Silêncios Mudos

Fechem os olhos e sejam novamente bem-vindos à Cidade Invisível.

É uma cidade, onde as suas ruas e becos, amontoados de abandono, são percorridos por personagens anónimos.

Acabei de me levantar neste imenso deserto, onde a deslocação do mais pequeno grão de areia seria capaz de aziumar a mais triste alma que paira neste éter inútil.

Parti em busca de uma forma de vida digna de substituir a minha eterna companheira, também chamada de solidão.

O certo é que estou perdido. Não sei que direcção tomar. Aqui não se ruma a Norte, nem a Nascente. A confusão deste vácuo espaço, onde a certeza do amanhã é coisa para sonhadores, todas as direcções confluem no triste desígnio do nada.

Mas vou começar a caminhar. Caminhar sem destino mas com propósito.

É hora de começar a minha viagem pela Cidade Invisível.



Capítulo 2: Vozes do Silêncio

Já estou farto de caminhar e não vejo nada.

São silêncios atrás de silêncios. Mudas linhas de horizonte. Mesmo que quisesse regressar à Cidade Invisível, seria incapaz de o fazer.

Não o digo por falta de vontade, mas sim porque já lhe perdi a conta aos passos errantes que dei desde que saí do velho eléctrico.

Calma, acho que oiço vozes no infinito sombrio que emana este deserto. Vou caminhar atrás delas.



Capítulo 3: Vozes do Silêncio

Já consigo avistar algo por entre as monumentais cortinas de pó. Parece-me algo com mais cor. Talvez verde. Vou-me aproximar.

À medida que me aproximo, tudo se torna mais calmo. O vento já não me faz companhia. Uma rasteira vegetação começa a preencher o piso por onde me desloco.

Ao fundo, erguem-se enormes paredes de arbustos. Ouvem-se quentes sons por detrás destes aglomerados de verde. Uma enorme sensação entre a calma e a extrema ânsia toma conta de mim.

O que será este estranho lugar? Vou-me aproximar.

Tudo em volta parece capaz de intimidar o maior perfeccionista. A simetria, aqui, engole por completo o acaso. As longas e apolíneas melodias tomam conta de todo o espaço. O tempo, que já nada importa, parece deslocar-se a uma velocidade capaz de entediar a longa persistência do Criador.

Claramente, este sítio em nada pertence à Cidade Invisível que deixei para trás.

Vou entrar. Mas antes, sentar-me-ei aqui uns minutos. Já há muito que não sentia um lugar assim.



Capítulo 4: Labirinto Espiral

Já transpus aqueles monumentais arbustos. Mas, para minha grande surpresa, o epicentro destes deleites melodiosos e paisagens mornas, está muito para lá desta primeira linha verde.

Agora que reparo bem, acabei de entrar num enorme labirinto. Será este emaranhado de caminhos confusos a muralha que protege aquilo que tanto procuro?

Será este a lar daquele misteriosa semelhante atrás da qual parti sem destino?

Vou começar a minha caminhada. Pode que me demore alguns por-de-sóis. Ou talvez vários séculos.

Mas não importa. Sinto que o que procuro estará para além destas muralhas de arbustos.

Afinal de contas, já há muito que parti daquela cidade, na qual, por força da triste ambiência de ignóbeis semelhante que acreditam no amanhã, me vi obrigado a partir.


Playlist

Thomas Neuhaus - The Bad Boys Were Prodding the Bear Through the Bars of the Cage (Ex Machina. Vol. 5, 2001 - Cybele)
Karlheinz Strockhausen - Klavierstücke XII (Klavierstücke XII-XIV, 1983 - Deutsche Grammophon)
Mile Davis - All Blues (Kind of Blue, 1959 - Columbia)
Terry Riley - A Rainbow in Curved Air (A Rainbow in Curved Air, 1969 - Columbia Masterworks)
Vómito Negro - Running Out Of Time (13 Incisões, 1989 - Facadas na Noite)

Programa n.º 3 [04/AGO/2010]

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Capítulo 1: A smi-horizontalidade

Fechem os olhos e sejam novamente bem-vindos à Cidade Invisível.

São rua e becos, amontoados de abandono, percorridas por personagens anónimos.

Como ficou prometido na última vez, não regressei a casa. Fiquei aqui, no mesmo exacto sítio de onde parti em busca de algo que me fizesse esquecer isto que agora tanto anseio.

Foram dezenas de horas junto desta fresca brisa, junto de milhares e milhares de odores putrefactos diferentes, que nada mais são que o reflexo do egoísmo do homem.

Passaram por mim dezenas de anónimos transeuntes. Alguns sozinhos, outros acompanhados pela solidão.

Não há tempo para perder com palavras e gestos simples, mas também não há espaço para o despotismo egoísta que por vezes se nos apresenta no pensar como falsídica esperança de acreditar no amanhã.

Gostava de conhecer alguém nesta cidade que se tivesse reduzido à sua inegável insignificância de tal modo que já tivesse o pensar livre. Tão livre que o tornasse já capaz de pensar em algo diferente, algo que, mais século, menos século, se torne obsoleto e patético.

Mas, onde procurar um semelhante assim nesta cidade?

Talvez nos arredores, longe do negro epicentro criacionista que estes ignóbeis semelhante criaram e no qual se refugiam, pensando que a adormecida Providência, num acto de extremo gozo, os tenha tido como protegidos.

Bem, está na hora. Vou começar a minha viagem de hoje por esta Cidade Invisível.




Capítulo 2: A viagem

Já estou farto de caminhar. Acho que vou apanhar o velho eléctrico.

Adoro o facto de olhar pela janela e conseguir ver, num espaço de tempo tão reduzido, uma quantidade tão grande de simples transeuntes, de realidades e adiamentos, mas, essencialmente, gosto do simples facto de ver o mundo a uma velocidade que o Criador nunca pensou que insignificantes criaturas do belo o conseguissem fazer.

Gosto de desafiar os limites impostos pela adormecida Providência.

Bem, vou entrar no velho eléctrico e, sentado nos seus austeros bancos de madeira, contemplar toda esta viagem do centro da cidade até aos seus arredores.



Capítulo 3: Os arredores da Cidade Invisível

Já se ouvem os fortes ventos vindos dos longínquos e solitários arrabaldes da Cidade Invisível.

Aqui, marginais transeuntes, entregaram-se há muito ao pérfido abraço infinito e vazio de quem já nem no dia de hoje acredita.

Estou tão longe do negro coração desta cidade que até já consigo ver a eterna claridade do vazio flutuante, onde nunca nada fez sentido.

É um sítio tão distante daquele quarto onde me entreguei à triste ideia de dormir de olhos bem abertos que quase parece que se passaram vários séculos desde que comecei a caminhada de hoje.

O certo é que, por muito que prolongue a minha vista até às linhas do horizonte, não consigo ver ninguém.

Será que toda a gente fugiu para o centro da Cidade Invisível?

Não pode ser. Tem de haver por aqui alguém.

Talvez este forte vento soprado do profundo desconhecido distorça a luz que oscila na linha do horizonte. Talvez eu não esteja a procurar bem.

Impossível será que todos os meus semelhantes caíram na estupidificação do acreditar no amanhã.

Vou-me sentar por aqui e esperar tanto quanto seja preciso até que encontre algum semelhante.




Capítulo 4: Vultos disformes

Já levo aqui tanto tempo e ainda não encontrei ninguém. Se calhar, por muito que me custe a crer, o meu maior receio concretizou-se: todas as tristes almas solitárias viraram espíritos sonhadores.

Não pode o meu semelhante ter caído em semelhante artimanha do Criador.

Serei eu o único nesta Cidade Invisível a ter voltado a viver de olhos bem fechados após vários séculos dormidos de olhos abertos?

Isso fazer-me-ia o personagem anónimo mais importante desta cidade.

Não pode ser! O Criador, com certeza, não viu em mim um filho aqui tornado para se entregar ao irreversível nojo que é pensar ser melhor que todos os outros.

Vou continuar à espera. Nem que o virar dos milénios me torne pó me mexerei daqui enquanto não vir alguém por estes lados, alguém que já não partilhe o triste sentimento de acreditar no amanhã.



Capítulo 5: Vultos disformes 2

O vento torna-se cada vez mais forte e sol fica mais desbotado que nunca.

Talvez o mudo silêncio que emana esta triste paisagem tenha consumido todos aqueles que aqui vieram procurar a mais infinda pretensão do Homem, que é o já nada importar e a vácua solidão tornar-se a sua melhor amiga.

Mas não vou desistir de esperar. O Criador não me levará a abandonar esta cidade de novo.

Entretanto a noite já caiu. Nada me importa. Já me prometi com a eternidade que esperaria aqui por um reflexo do meu pensar em forma de gente.

Vou continuar a esperar, vou continuar a esperar.



Capítulo 6: Companheiro de viagem?

Calma. O que vem a ser aquele vulto que se aproxima de mim mais rápido que o próprio vento seco das profundidade do desconhecido?

Julgo ser um semelhante. Mas um semelhante que vem para além dos arrabaldes da Cidade Invisível.

Não conheço ninguém que se tenha perdido para além deste pérfido e terrível aglomerado urbano.

A julgar pela firmeza dos seus passos, julgo que este lugar lhe será uma constante.

Aproxima-se cada vez mais. Já quase o consigo ver.

Mas, como pode ser? Uma mulher, de longos cabelos negros, que agora já está verticalmente imposta diante dos meus olhos, pára com um extremo silêncio e, novamente, não lhe consigo ver o rosto, por muito mais que o tente.

Será esta a semelhante que vi junto da multidão de relógio em mão? Só pode ser ela. Mas como é que não lhe consigo ver as faces?

Entretanto, já falei com ela, mas não obtive qualquer tipo de resposta.

Será mais um obstáculo do criador para que volte a acreditar no amanhã? Não entendo.

Entretanto, essa misteriosa figura já partiu. Mesmo antes que conseguisse esboçar o mais pequeno diálogo. Quem será? E porque me persegue? Será uma alma de tal modo evoluída que já nem o diálogo ou o rosto que a distingue de todos os anónimos transeuntes são importantes para ela?

Acho que já não faz sentido ficar aqui sentado. Vou partir atrás dela, vou caminhar pelo desconhecido. Afinal, nada temo, já nada me interessa.


Capítulo 7: O amanhã

Já não consigo ver nada. Nos confins do horizonte nada existe e a Cidade Invisível, que deixei para trás, já se escondeu detrás da linha do sol-posto.

Não vos consigo precisar quantos mais passos terei de dar para que me cruze com algo pelo caminho.

O pesar do cansaço já me bloqueia a locomoção. Creio que vou parar e descansar neste infinito vazio e partilhar largas horas com a minha mais fiel companheira.

Mas… Que estou a dizer! Até parece que voltei a acreditar no amanhã.

Como posso eu estar a fazer planos?

Estará o Criador a tentar reconverte-me à triste crença de viver de olhos bem fechados?

Não interessa… Estou exausto desta caminhada de hoje. Vou mesmo parar por aqui.

Este eterno silêncio também me faz falta.




Playlist:

Sigur Rós - Sigur Rós (Von, 1997 - Cut)
Factory Floor - A Wooden Box (Untilted, 2010 - Blast First Petite)
Hangdeup - Losing Your Charm (Kicker in Tow, 2002 - Constellation)
Nurse With Wound - Two Mock Projections (Chance Meeting, 1979 - United Dairies)
Faust - Meadow Meal (Faust, 1971 - Universal Distribution)
Cindytalk - Through Water (In This World, 1988 - Touched)
Goblin - Sighs (Suspiria OST, 1977 - Dagored)
Cluster - In Ewigkeit (Sowiesoso, 1976 - Gyroscope)